Amigos de escola primária!


Amigos de escola primária
A Geografia é coisa que se aprende na escola. Essa ciência tem a maior influência na nossa vida, muito embora a gente nunca pare para pensar nisso. Pensem só na diferença que pode significar para quem vive à beira-mar ou no interior, a centenas de kilómetros do mar. Há gente que nasce e morre sem nunca ter visto as ondas a bater no paredão. Mas há muitas outras diferenças, como nascer no Ártico ou nos trópicos, entre negros do Ruanda ou índios do Amazonas.



Mas aquilo de que vos vou falar é mais relativo, trata.se apenas de ter nascido no Lugar do Outeiro, a parte da nossa freguesia com maior altitude, e apanhar pelo caminho, até chegar ao adro da igreja, alguns colegas de turma que moram no Outeiro, além do Amaro do Matos que vinha da Gandarinha. A ele se juntavam o Serafim Farinheiro e o Quim Pimpa que comigo e o Quim do Salvador perfazia um grupo de 5 amigos que nunca andavam muito longe uns dos outros.

Parece que não, mas fazer o caminho de ida e volta para a escola, durante 4 anos, cria laços que se mantêm para a vida. O Quim do Salvador, por ser filho de lavradores, era o que menos participava nas nossas brincadeiras, durante a tarde, tinha que ir para o campo ajudar nas tarefas que requeriam a participação de todos. Nós, os outros 4 também tínhamos algumas tarefas distribuidas pelos pais, mas era coisa de pouca monta e, por vezes, juntávamo-nos para as levar a cabo em conjunto.

Por exemplo, o Amaro e eu tínhamos que arranjar lenha, caruma (em macieira dizia-se pruma) ou fetos e íamos juntos, uma vez para os Eiteirais, outra vez para os lados da azenha e Bouça do Adro. O que era preciso era fazer o dever o mais rápido possível para sobrar tempo para a brincadeira. E se regressássemos de mãos vazias, inventar uma boa história para contar ao pai ou à mãe que nos tinha dado o encargo.

O Quim Pimpa tinha que ir com a burra pelos caminhos, de modo a ela encher a pança por fora, pois em casa pouco havia que comer. O Serafim e eu juntávamo-nos a ele, às vezes, para tentar dar umas voltinhas no lombo do animal que nem dava por nós de tão levezinhos que éramos.

Algumas vezes, à falta de melhor entretimento, acompanhava o Quim do Salvador para os campos. Umas vezes para o campo dos Eiteirais que ficava no caminho que vai para Courel, antes de chegar aos terrenos que já pertenciam à freguesia de Gueral. Outras vezes para o Campo da Agra que ficava ao lado do da Tia Rosa, a que ela chamava, o Campo da Fonte. Porque a entrada para esse campo era junto à famosa e muitas vezes mencionada por mim nos meus escritos, Fonte do Outeiro. E por último, para o Campo da Mulher Morta que era o que mais longe ficava das nossas casas, quase a chegar a Rates.

Hoje, pensando nessa época da minha vida, reparo que só Quim do Salvador e eu próprio escapámos à viagem final que o destino nos oferece, sem qualquer custo, quando o nosso ciclo de vida na Terra chega ao fim. E bem vistas as coisas, cumpriu-se a ordem natural, pois eles três eram os mais velhos. O Amaro e o Quim Pimpa eram primos e, salvo erro, nascidos em 1942. O Serafim era de Outubro de 1943 e faleceu no Lobito, Angola, há pouco tempo. Depois venho eu, de Março de 44 e o Quim do Salvador, de Julho do mesmo ano. Isso quer dizer que sou o próximo na lista de prioridades e o Quim ficará sozinho à espera da vez dele. Mas nem sempre acontece assim, às vezes os últimos são os primeiros.

E pronto, foi o que me apeteceu publicar hoje. Não é, propriamente, sobre a minha ascendência, mas sobre os tempos antigos, na freguesia onde nasci e de onde abalei - como dizem os alentejanos - aos 11 anos de idade para ir estudar, em Coimbra. Depois disso, só voltei a Macieira por curtos períodos. A primeira vez, por 5 meses, antes de ingressar no Colégio de D. Nuno, na Póvoa, e a segunda vez, por 3 meses, depois de abandonar esse mesmo colégio. Em Outubro de 1960, ainda com 16 anos de idade, disse adeus a Macieira, quando a família se mudou para Argivai e no ano seguinte para Touguinha.

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